sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Atleta baiano de jiu-jitsu supera deficiência visual

Força, coragem e determinação são palavras que fazem parte do dia-a-dia de Valtonei Silva Chagas, 30 anos. Atleta há dois anos e meio, é um exemplo de superação por praticar Jiu-jitsu mesmo com deficiência visual, o que não impede que tenha conquistado títulos e vitórias.

Mas conhecido como Pit, devido a sua força de vontade, ele treina diariamente. Sua evolução no esporte fez com que se tornasse faixa roxa. “Não me sinto um deficiente físico, mas um eficiente” declara sorrindo.

Com 17 vitórias e uma derrota, todas as lutas que enfrentou foram com pessoas, sem deficiências, pois “além dele, existe apenas um americano com a mesma deficiência que pratica essa modalidade esportiva”, explica* Marcio Bittencourt, mas conhecido como Marcito, 31 anos, proprietário e professor da academia Fight Club, a qual Pit treina.

*A perda da visão

Aos oito anos de idade Pit perdeu a vissão, em decorrência de um glaucoma congênito. Segundo o Doutor Ralph Coehn “é uma enfermidade rara, apesar de se constituir na modalidade mais comum de glaucoma que se manifesta na infância” explica.
Não ter um membro do corpo ou a ausência de um dos órgãos do sentido, parece ser muito difícil para quem tem todos, mas para, Pit, é um desafio.“Às vezes o vejo andando sozinho em Brotas; é incrível”, comenta o estudante de jornalismo Luciano Genonadio. “Quando o levo para casa, ele me ensina certo o que caminho que tenho que fazer”, afirma Tirex, faixa roxa, amigo de Pit.

*O treino

A academia fica localizada em Brotas, na Ladeira do Pepino. “O trabalho voluntário que Marcito faz, já ajudou a tirar muitos jovens da vida improdutiva”, conta seu aluno, Marcelo Palombo, conhecido como Tirex.
O treino de Pit é diferenciado, porque necessita de mais tato, para entender o que o Sensei (mestre) ensina. “O jiu-jitsu é uma luta de muito contato, por isso posso expor mais a minha técnica” explica Pit.

Pit conta com detalhes como funciona seu processo de aprendizagem, “o mestre faz a posição de golpe que ele quer ensinar, em mim, então eu estou sentindo como o golpe está encaixado, a partir daí vou pegando no mestre, para sentir em que posição ele está. Depois, o mestre faz essa mesma posição em outra pessoa e eu vou tateado as duas pessoas, para poder entender como é o golpe. Nesse processo, o mestre vai corrigindo se está certo ou errado e detalhando o que não pode faltar na hora de aplicar o golpe perfeito”, detalha. “É um processo complicado de aprender, porque requer muita paciência, dedicação, determinação, disciplina e muitas outras qualidades”, comenta Marcelo Maia, faixa roxa, amigo de Pit.

Ele treina 2h, todos os dias, “é um exemplo para todos nós. Às vezes estou triste e chego aqui na academia achando que os meus problemas são os maiores do mundo, quando olho para Pit, e o vejo sorrindo no do-jô (tatame), pronto para combate, isso me dá mais forças”, declara Marcito. Segundo ele é um o prazer ensinar o esporte também conhecido como Arte-Suave, “desenvolvi uma didática própria de passar os golpes para Pit”, conta.
Em época de campeonato Pit diz dedicar mais tempo, chega a praticar duas aulas por dia, uma pela manhã e outra pela noite. “Ele já tem a chave da academia, falei que iria colocar um horário pela madrugada, porque ás vezes ele troca o dia pela noite”, afirma Marcito. “Seria bom se outras pessoas que possuem a mesma dificuldade praticassem o esporte, pois além de aumentar a auto-estima, adquire autoconfiança”, conclui o professor.

*O campeonato

O último campeonato que Pit lutou foi o Baiano de jiu-jitsu, realizado em agosto de 2007, em Salvador. No qual foi campeão e está liderando o ranking, pois na I etapa deste mesmo campeonato, não teve lutador em sua categoria, que é máster médio até 82 kg com kimono, mas o peso de Pit atual é 80 kg.
A força também vem da família, amigos e da sua esposa Cláudia, que o ajuda nos campeonatos, dando apoio e palavras de conforto para amenizar a adrenalina sentida antes das lutas. “Eu venho me inspirando muito neles, porque além de fazer o que eu gosto e ter uma vida melhor, eles me estimulam a viver disso e me profissionalizar”, conclui.
“Acho o jiu-jitsu da Bahia maravilhoso, mas, falta incentivo dos patrocinadores para que os atletas possam conquistar um mercado de trabalho através da luta e que não sejam vistas de forma marginalizada e violenta. O jiu-jitsu é um esporte que destaca qualidades positivas no ser humano”, conta o lutador. “O jiu-jitsu ensina, a todos os alunos que não devem brigar e sim procurar a paz”, completa.
Durante os treinos, o professor ensina que o limite de cada um começa, quando o do outro termina. “Ele diz que todos têm a mesma capacidade que você, portanto não desafie ninguém. O que você sabe fazer, o outro também pode”, acrescenta.

*O patrocínio

Pit contou que os apoios ao esporte em Salvador estão com déficit muito grande, “as empresas de pequeno, médio e grande porte deveriam incentivar mais os atletas, pagando as inscrições de campeonatos, patrocinando a suplementação alimentar, para que possamos lutar em outros Estados, divulgando através de nós suas empresas e o nosso trabalho, pois é o que fazemos de melhor, na verdade, seria uma troca”, completa ele.
Pit ressalta que é fundamental o apoio que o fundador da Federação Baiana de Jiu-Jitsu (FBJJ) – Ricardo Carvalho tem dado ao esporte na Bahia. “Eu admiro o que o nosso sensei maior, faz. O trabalho que ele está fazendo aqui na Bahia é muito bom, gratificante, mas, ainda é necessário mais apoio. Pequenas, médias e grandes empresas poderiam colaborar mais, para que nossos eventos fossem cada vez melhor”, disse Pit.
Ricardo Carvalho tem patrocinadores que facilitam os campeonatos Baianos acontecerem. “Isso faz com que muitas pessoas continuem treinando e lutando literalmente por mais espaço, para que o jiu-jitsu passe a ser um esporte olímpico como é com o Judô”, comenta Pit.

*Dificuldades

Existem também outras dificuldades enfrentas por Pit, a de locomoção, “os carros estacionados nas calçadas, postes sem proteção para deficientes, orelhões públicos sem proteção, buracos encobertos, grades que abrem para o lado de fora, tapas de esgotos e da embasa abertos, piquetes, enfim, muitos outros atrapalham nossa locomoção na cidade”, disse ele. Mas, não pontuou apenas os problemas enfrentados diariamente, deixou também uma sugestão, “que o prefeito, olhe para nossa cidade com mais carinho, para que a gente venha ter uma cidade melhor, com melhores condições de locomoção, pois com isso vamos parar de bater nosso rosto nos lugares, muitas vezes danificando a nossa face, tendo estrago maior”, termina Pit.

Elena Martinez

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